Casa de Cello – Quinta de Sanjoanne

A velha rotuladora artesanal, que ainda cumpre a sua função, é demonstrativa da forma como por aqui se encara a produção de vinho. Uma cultura de vigneron (agricultor, artesão e artista), onde se privilegia a autenticidade, com processos simples, que vão da vinha à adega. O resultado desta filosofia está bem patente nos vinhos, como tivemos oportunidade de conferir logo de seguida.

Já falei aqui várias vezes sobre a Casa de Cello, o projecto de João Pedro Araújo e sua esposa Ana Teresa, onde os brancos nascem no Minho e os tintos no Dão. Sendo vinhos que gosto particularmente, foi com redobrado entusiasmo que encarei o desafio de me deslocar à sua propriedade, junto a Amarante, onde nascem os brancos da Quinta de Sanjoanne, para uma vertical de quase 30 dos seus vinhos. Uma prova que se revelou memorável.

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A alvorada estava marcada para uma hora pornográfica mas nem isso demoveu a boa disposição com que se cumpriram, quase sem darmos por isso, os 350 km que nos separavam do nosso destino. À chegada tínhamos a receber-nos João Pedro Araújo que depois das boas-vindas nos encaminhou para a adega onde fez uma pequena introdução sobre o seu projecto.

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João Pedro Araújo
João Pedro Araújo a desvendar algumas das características do seu terroir.

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A velha rotuladora artesanal, que ainda cumpre a sua função, é demonstrativa da forma como por aqui se encara a produção de vinho. Uma cultura de vigneron (agricultor, artesão e artista), onde se privilegia a autenticidade, com processos simples, que vão da vinha à adega. O resultado desta filosofia está bem patente nos vinhos, como tivemos oportunidade de conferir logo de seguida.

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A prova foi dividia em três partes, por estilo de vinho e não por ano de colheita, começando com a gama Terroir Mineral. Depois da boca limpa pelo Terroir Mineral de 2013, que aparece já com a nova roupagem, com novo rótulo e em garrafa borgonhesa, partimos para uma vertical de 14 vinhos. De 2012 a 2002 percorreram-se todas as colheitas e no final terminou-se com o 96, o 97 e o 99, ainda sob a marca Leiras Mancas, a primeira da Casa de Cello.

O Terroir Mineral é um vinho que conheço bem, que costumo beber ao longo do ano e que faço questão de guardar umas garrafas em cave para ir apreciando a sua evolução, mas mesmo assim não deixou de ser surpreendente verificar como estes vinhos, que custam entre 5€ e 6€, demonstraram uma invejável longevidade. Cítricos, minerais, finos, de acidez viva enquanto novos, que desenvolvem uma nobre complexidade com alguns anos de estágio em garrafa. É um luxo para o consumidor comprar um vinho deste preço e ter o prazer de, dez anos após, encontrá-lo melhor do que quando o comprou.

Nesta prova, apesar de todos os vinhos estarem em perfeitas condições, destaco o 2011 (Avesso e Loureiro), nada evoluído na cor, frescura aromática, redondo na boca, envolvente, de belo comprimento, um jovem. O 2008 (Avesso e Loureiro), com o vinho a mostrar bom equilíbrio entre a mineralidade e as notas mais complexas que ganhou pelo tempo em garrafa, com uma acidez fina que lhe deixa antever uma longa vida. O 2007 e 2005, que aparecem com tudo no lugar, numa expressão elegante e equilibrada de acidez, mineralidade e comprimento. Dois favoritos. Por último destaco a colheita de 2003, com o vinho a mostrar-se pouco evoluído na cor, com boa expressão, a confirmar que não foi um ano tão mau assim, como se alvitrou durante muito tempo. Palavra final para os Leiras Mancas, sendo o 1996 o primeiro vinho a ser produzido na propriedade, a mostrar grande vitalidade ao fim de quase 20 anos.

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Após um intervalo para ganhar fôlego e provar algumas iguarias preparadas pelos nossos anfitriões, onde se incluía uma quiche trazida pelo Amândio Cupido, que ao fim de muitos anos a seguir o seu blog finalmente conheci pessoalmente, passámos à segunda e terceira parte da prova começando pelos Sanjoanne Escolha.

A diferenciação para a gama inferior é feita através da diferente escolha de castas e parcelas e um trabalho de batonnage mais apurado. Os Quinta de Sanjoanne Escolha foram criados para ser vinhos de guarda, com o objectivo de provar que a região do Vinho Verde tem capacidade para produzir brancos de grande qualidade e longevidade. Começaram por ter madeira (também eram conhecidos por Barricas) e deixaram de ter a partir de determinado momento. Foram provados 9 vinhos, das colheitas de 2013, 2010, 2009, 2004, 2003, 2001, 2000, 1999 e 1998, todos bem vivos. Destacaram-se o 2001 e o 1998, a comprovar que é ao fim de alguns anos que estes vinhos se expressam na plenitude. O 2001 (Chardonnay, Alvarinho e Avesso) veio confirmar a prova que tinha feito há cerca de três meses atrás. Está um grande vinho, com notas de mel e frutos secos a dar complexidade a um conjunto fino e equilibrado. O 1998 ainda consegue estar ligeiramente acima o que é impressionante para um vinho com mais de quinze anos. Já se tinha destacado em Outubro último quando foi provado no âmbito da #provados7 e agora voltou a deixar marcas. Complexidade, frescura e um final arrebatador, a deixar a ideia que ainda temos vinho para muito mais tempo.

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Terminámos com chave de ouro com a prova de 4 colheitas do topo de gama da casa, o Sanjoanne Superior, que é produzidos apenas em anos excepcionais com uma criteriosa selecção das melhores uvas. 2012 (que ainda não chegou ao mercado), 2009, 2007 e 2005. Belo o 2009, na fase da mudança, quando a fruta começa a dar lugar a aromas mais complexos, com uma frescura e comprimento a deixar antever uma longa vida. Enorme o 2007, no mesmo patamar da garrafa magnum aberta em Novembro do ano passado também por ocasião de uma Prova dos 7. Agarra-nos de imediato pelo aroma, assente num refrescante fundo mineral, para depois nos arrebatar com uma boca ampla e fresca, de acidez equilibrada, num final fino e longo. Se tivesse de escolher apenas um vinho no meio destes todos (Deus nos livre de tal maldição), este 2007 era um forte candidato. Não podia deixar de fazer uma menção também ao 2005, num estilo que me pareceu mais austero, mas também ao nível dos melhores. Não me surpreendia se acabasse por ter mais longevidade que o 2007, está um jovem.

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Os 14 hectares de vinha dão lugar a 18 parcelas com exposições solares e características diferentes, que vão influenciar o resultado final do que nos chega ao copo.

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Se duvidas houvessem, ficou a certeza que apesar de estarmos numa região que não é de imediato conotada com vinhos de grande longevidade, os brancos da Quinta de Sanjoanne, mesmo nas gamas mais baixas, já são porta-estandartes deste novo paradigma. Alguns irão mesmo tornar-se vinhos de culto. Afinal, Vinho Verde, complexidade e longevidade podem conviver na mesma frase.

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