Adegga Pop Up, Wine Fest e a Tinta Negra da Barbeito

Uma tarde de sábado passada à volta de muitas garrafas e de muitas provas. Comecei na Sala de Provas do Adegga, na Rua Amorim, numa zona oriental da cidade que aos poucos vem ressuscitando (e ameaça tornar-se a next big thing do imobiliário na capital), com o primeiro Adegga Pop Up em Lisboa e terminei na 2ª edição do Wine Fest que este ano aconteceu no Salão Nobre do Hotel Ritz e que trazia no programa uma prova comentada sobre a casta Tinta Negra conduzida por Ricardo Diogo dos Vinhos Barbeito.

No Pop Up do Adegga, que é um evento paralelo do original Winemarket que decorria no mesmo dia na cidade do Porto, tive a oportunidade de contactar com mais atenção com os brancos de 2015 (ando a fugir de vinhos muito novos como o diabo da cruz por isso estas ocasiões são preciosas para sentir o pulso ao mercado). As primeiras impressões – de uma amostra que não foi muito grande mas que ainda assim serviu para retirar algumas ilações – vão no sentido da qualidade dos vinhos brancos continuar, regra geral, a aumentar e a preocupação dos produtores de seguir a tendência do mercado com vinhos mais elegantes, mais frescos, com mais acidez e menos alcoólicos e pesados. Notei no entanto em alguns vinhos, principalmente nas gamas mais baixas, muita acidez mas sem a riqueza de fruta suficiente para dar equilíbrio e estrutura aos mesmos, algo que a juventude que ainda apresentam não deixou concluir de todo (alguns tinham mesmo ainda a presença de sulfuroso) pelo que, lá mais para o verão e com mais algum tempo de garrafa seja possível retirar outras conclusões. Ainda assim bons sinais para um ano que traz consigo grandes perspectivas.

 

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Um vinho que se destacou dos demais foi o Carvalhas Branco da Real Companhia Velha. Talvez o facto de já ser da colheita de 2013 tenha ajudado mas a verdade é que este branco duriense está num plano muito bom. Frescura, mineralidade, untuosidade, tudo no ponto certo e bem conjugado com a fruta, resultando num conjunto muito entusiasmante. Boas indicações deixaram também o Duas Quintas Reserva Branco 2014 e o Enólogo Encruzado Branco 2014, que apesar da evidente juventude já dão muito prazer a beber.

Deixemos a zona do Braço de Prata e o Pop Up do Adegga e rumemos agora para o centro da cidade, para o charmoso Hotel Ritz, onde decorreu o Wine Fest, o evento organizado por Luís Gradíssimo, autor do Blog Avinhar.

Sala muito bonita, com boas condições para um evento do género, com um pé direito respeitável e uma varanda imensa de frente para o já verdejante Parque Eduardo XVII. Boa afluência de público mas ainda assim sem enchentes, o que possibilitava provar com relativa facilidade.

A minha maior expectativa para este evento era a prova comentada sobre a casta Tinta Negra que seria conduzida por Ricardo Diogo dos Vinhos da Madeira Barbeito. Enquanto não chegava a hora da prova aproveitei o momento para ir conhecendo mais alguns vinhos, tudo de forma muito cirúrgica pois o tempo já não era muito. De todos, e para não ser muito exaustivo há um que tenho de  destacar, o branco de 1993 da bairradina Casa de Saima. Uma maravilha. Um “simples” colheita com tudo no sítio. Preciso, límpido, imaculado, uma tentação que infelizmente já não é possível comprar.

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Sigamos então para a prova sobre a Tinta Negra.

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Ricardo Diogo dos Vinhos Barbeito.

Ricardo Diogo, produtor dos Vinhos Barbeito, preparou uma apresentação acessível, com uma linguagem muito simples, que conseguiu envolver curiosos e conhecedores com a mesma eficiência. E como isso é por vezes difícil de conseguir, ainda para mais num ambiente prejudicado pelo ruído de fundo que vinha do evento. Um factor que a própria organização reconheceu ter prejudicado a prova e que prometeu alterar em futuras edições. Mas mesmo com essa condicionante técnica a prova foi valiosa, afinal não são todos os dias que temos a possibilidade de assistir a uma verdadeira masterclass sobre o Vinho da Madeira e a casta Tinta Negra em particular e logo por Ricardo Diogo, um produtor que tem colocado nestes últimos tempos este tipo de vinho, desconhecido por muitos, na órbita dos consumidores.

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A Tinta Negra é uma casta mal-amada na produção de Madeiras mas este produtor fez questão de deixar bem claro que na Barbeito é respeitada da mesma forma que as mais cotadas Boal, Verdelho, Terrantez e Malvasia. Enquanto descrevia as qualidades da casta ia servindo um conjunto de vinhos para os presentes puderem ir aquilatando a evolução dos mesmos e a expressão da casta. Primeiro um vinho muito jovem, cheio de tanino e de acidez vigorosa, depois uma colheita de 2004, produzido a partir de uma vinha única de Tinta Negra no Estreito da Camara de Lobos, para entrarmos de seguida nos vinhos com mais idade. Passámos pela década de 90, onde se vai percebendo a diferença entre um vinho seco e um meio doce, para terminarmos em êxtase nas décadas de 40 e 50 com dois vinhos fabulosos. A prova não termina sem que Ricardo Diogo, de proveta na mão, exemplifique ali mesmo à frente de todos, a forma como se criam os lotes de Vinho da Madeira na Barbeito. A ligação da juventude do 2004 com a complexidade do 1954 fica como a última recordação desta prova. Que deixou evidentes as potencialidades da Tinta Negra mas também que os Madeira estão à altura dos melhores vinhos fortificados que se produzem em Portugal. Um aperitivo delicioso para a visita que conto fazer ao arquipélago num futuro próximo.

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